“Aqueles anos do Barreirense!” Invariavelmente, em conversas públicas ou no burburinho de uma roda de amigos a falar de bola, o clube do Barreiro é (quase sempre) motivo de falatório sobre as lendas do futebol português que ofereceu.
Não raras vezes, dão-se à memória esses tempos em que o Barreirense gerava (bom) futebol à velocidade que passavam aqueles tempos idos. Velozes, muito velozes numa área geográfica marcada pela industrialização que, ainda assim, os ventos do tempo não apagam da memória.
Foi desse Barreirense que o Jogo do Povo foi à procura na Margem Sul do Tejo à ‘boleia’ de Rodrigo Antunes, defesa da equipa que vai brilhando no Campeonato de Portugal, sem receios nem dúvidas quanto ao presente e ao futuro, porque é firme o passo. E assim, como canta Sérgio Godinho, “dá-se a volta ao medo e dá-se a volta ao mundo”.
Pelo Barreiro, se antes estava em jogo a identidade de uma região, hoje entra na equação também a necessidade de vencer. Continuar a ter orgulho pelas raízes, sim, mas procurar fazê-lo com as necessidades atuais de um futebol cada vez mais específico.
Barreirense, um emblema com estatuto no futebol
Ao tentar elevar o emblema a um patamar que já foi seu, por direito, o plantel do Barreirense sabe que na sombra do passado podem sempre encontrar o exemplo que oferece luz para o caminho. Mas é preciso que a viagem se faça em segurança e com um rumo bem definido.
Moldando o futebol às práticas do presente e esperando pelo futuro, sempre olhando com carinho para o passado, o Barreirense arrisca o trilho próprio carregando um emblema que se fez grande pela bola e na bola, e que nunca perdeu esse estatuto.
Em nome do futuro, a convicção escreve-se na relva com a mesma entrega de outrora, ainda que os tempos sejam diferentes.
“O Barreirense é um clube histórico, liderado por pessoas que vivem o clube e sentem a sua grandeza”, explicou Rodrigo Antunes, ciente de que há uma união de esforços para elevar o clube no futuro na rota do que foi no passado.
Para isso, o defesa diz que se vai tentando conciliar “a sua grande massa associativa e a sua claque, que apoiam o clube incondicionalmente”.
“Acredito que tem as condições para voltar a pisar os grandes palcos nacionais, apesar de ser necessário para tal, algum investimento financeiro”, reconheceu o jogador do Barreirense.
“O Barreirense é um clube histórico, liderado por pessoas que vivem o clube e sentem a sua grandeza”
Integrado numa série competitiva e intensa no Campeonato de Portugal (CP), o Barreirense faz de cada jogo uma final onde a vitória vai sempre no pensamento. Como vai também a consciência das dificuldades.
“O Barreirense tem tido nos últimos anos muitas dificuldades em manter se no CP após o ano de subida. Para esta época o objetivo é assegurar a manutenção e permitir que o clube consolide cada vez mais a sua presença nos Campeonatos Nacionais”, observou o defesa do Barreirense.
E é nesta consciência de que nada é fácil que o grupo de trabalho pauta a sua lógica de missão desportiva onde todos são chamados, não apenas os craques da bola.
“Em termos de plantel, jogadores e staff técnico, temos uma equipa jovem, alguns com formação nos melhores clubes nacionais, que esperam que este possa ser o seu ano de afirmação e viram o Barreirense como um clube que os possa ajudar a dar esse salto”, enfatizou Rodrigo Antunes.
Aos 25 anos, o jogador continua a ter os mesmos sonhos no futebol como em criança, naqueles tempos em que a Rua Morgado de Setúbal, no Bairro Santos Nicolau, era caminho de esperança para um futuro melhor e mesmo nos dias mais tristes da infância era a bola, sempre ela, a provocar sorrisos e a deixá-lo refeito.
“O futebol está na minha vida desde o dia em que nasci. Nos meus aniversários, se havia uma prenda que não podia faltar era a clássica bola de futebol, e nunca faltou”, recordou, com orgulho, lembrando que, curiosamente, nunca foi jogador de rua.
“Nunca fui de jogar muito na rua, mas todos os intervalos na escola, desde a primária até pelo menos ao 6.º ano, foram passados a jogar futebol, fosse com uma bola, uma bola de ténis ou até com um pacote de sumo”, contou ao Jogo do Povo.
No fundo, o futebol desperta a originalidade e promove o coletivo, sendo certo que, em algumas ocasiões, até no recato de um silêncio podem imaginar-se os melhores sonhos de menino.
“Muitas vezes quando estava sozinho, imaginava-me na final do mundial por Portugal, a marcar o golo da vitória e a festejar”, referiu o jogador de 25 anos que ainda passou pela natação, mas o desejo do futebol falou sempre mais alto.
Operador logístico durante o dia, central à noite
“Rapidamente pedi para mudar, porque o que eu queria realmente era ter uma bola nos pés”, confirmou o defesa do Barreirense.
No CP a realidade dos jogadores de futebol e dos diretores ou de todo o staff que acompanha as equipas não é sempre um ‘mar de rosas’ como se possa imaginar. Muitas vezes, é necessário fazer mais do que se espera, ou do que o formalismo possa estabelecer.
E é nessa entrega que muitos jogadores por este país fora se enquadram. Com Rodrigo Antunes não é diferente. Por isso, as vitórias têm um sabor especial em campeonatos amadores ou semiprofissionais. E os sonhos também.
“Com o passar dos anos, os sonhos vão sendo cada vez mais realistas. Preocupo-me em ser feliz, desfrutar dos jogos, dos treinos e sentir que realmente o futebol é a minha paixão. Enquanto assim for, vou dar o meu melhor e trabalhar ao máximo. O resto fica nas mãos de Deus”, disse Rodrigo Antunes nesta entrevista ao Jogo do Povo, no Bancada.
As dificuldades também entram no caminho tantas vezes mas, como quem conduz a bola para afastá-la da sua baliza e procura terrenos mais avançados (e, ao mesmo tempo, mais seguros), Rodrigo Antunes reconhece que é preciso saber lidar com os vários momentos que o futebol apresenta aos desportistas.
Foi assim que lidou quando perdeu o “amigo” que fez parte da família desde criança e que nas suas quatro patas o ajudou tantas vezes a fintar adversidades.
Rodrigo jogava no Moura AC no CP e aprendeu aí uma lição. “Perdi o meu melhor amigo de infância, o meu parceiro de quatro patas, e não ter estado com ele nos seus últimos dias, e não ter estado com a minha família, foi realmente muito duro e fez me na altura questionar muita coisa”, contou o jogador.
Pela estrada no Hyundai do avô ou o Peugeot 508 do pai
Rodrigo Antunes é central e não admira que os seus olhos procurem sempre as zonas do terreno de jogo onde circulam centrais, alguns ainda em ação como Pepe ou Sergio Ramos.
“Quando era criança, olhava mais para aqueles que marcavam os golos, como Luís Figo e Cristiano Ronaldo”, esclareceu-nos o jogador que não esquece os tempos de jogador de formação e nas viagens no Hyundai do avô.
“Quando fui para o Vitória já ia com o meu pai no seu Peugeot 508”, recordou o camisola 20 do Barreirense que tem horários apertados para conciliar o futebol com o emprego e a família, o seu pilar.
Assim, este operador logístico numa loja de desporto admite que até “tem sido fácil conciliar com o futebol, apesar de ser bastante cansativo”.
“Trabalhar 8 horas e ainda ir treinar à noite, como diz o velho ditado, quem corre por gosto, não cansa”, explicou Rodrigo Antunes. E tantos que andam por aí nos caminhos da bola a conciliar empregos, famílias e a paixão pelo jogo mais bonito!