Jogo do Povo
Marinhense. Cuidado com os vidros
2024-02-01 16:25:00
Entrevista a Miguel Vinagre, defesa do Marinhense, do Campeonato de Portugal

Nem sempre o futebol é feito de jogadas rápidas e linhas diretas à baliza. Nem sempre é possível ganhar com arte, porque o engenho tem uma palavra fundamental quando a coisa parece complicar-se. 

Nem sempre o tapete está verde com a esperança de a bola rolar perfeitamente. O futebol faz-se também na rua - já se fez mais, dizem - seja de alcatrão, terra batida ou empedrado. O futebol faz-se de balizas modernas, mas também de pedras que servem para marcá-las e o importante é jogar à bola, sem estragar nada.

Vidros, um ‘pesadelo’ para qualquer jogador de rua por isso cuidado

E foi tantas vezes aí que tantos jogadores de ontem, de hoje e, possivelmente os de amanhã, viram ecoar na mente uma frase batida: ‘Cuidado com os vidros’.

Os vidros foram e são sempre um ‘pesadelo’ para qualquer jogador de rua. O prejuízo sempre que a bola neles embate costuma ser algum, além do ‘raspanete’ que costuma estar reservado também.

É certo que este é um tempo em que muitos golos são desenhados na consola, onde a régua e o esquadro imaginário está nas mãos e na cabeça, mas não nos pés, que sempre ajuda a aperfeiçoar a trajetória.

É desse futebol que Miguel Vinagre, jogador do Atlético Clube Marinhense, diz ter saudades.

Numa conversa com o Jogo do Povo, o central de 27 anos, que também pode jogar como médio defensivo, revelou também que sente nostalgia de outros momentos no futebol “bairrista”.

“O que me marca é o futebol mais bairrista, aquele bar com cheiro a bifana, a cervejinha dos adeptos que aquecem as vozes para puxar pela sua equipa. Isto para mim é que marca a essência do futebol”, contou Vinagre, certo de que o futebol será sempre um universo de inspirações para quem, por esse país fora, luta diariamente para que o futebol mais popular triunfe.

E para esse triunfo muito valem os esforços de uma “paixão” que nasceu bem cedo. “Passava os dias a jogar, tanto na escola como em casa, bastava uma parede e uma bola e dava para imaginar um jogo”, recordou Miguel Vinagre, certo de que os vidros eram algo a evitar.

Por isso, o jogador procurou sempre aperfeiçoar os remates, tendo como inspiração alguém que está no patamar lendário do futebol. “Cresci a admirar o trabalho que o Cristiano Ronaldo vem fazendo ao longo destes anos, eu admiro todo o trabalho dele fora e dentro do relvado”.

“O que me marca é o futebol mais bairrista, aquele bar com cheiro a bifana, a cervejinha dos adeptos que aquecem as vozes para puxar pela sua equipa. Isto para mim é que marca a essência do futebol”

Natural de Valado dos Frades, Miguel Vinagre prossegue a carreira na capital do vidro ao serviço do clube da Marinha Grande, depois de, recentemente, ter estado mais para norte ao serviço do Trofense, da Liga 3.

Entre subidas e descidas geográficas no mapa do futebol e na divisão em que joga, Miguel Vinagre mostra-se satisfeito com aquilo que o futebol lhe vai dando, procurando sempre deixar “tudo” no campo quer nos treinos, quer nos jogos.

Esse é, afinal, o compromisso que tem com ele próprio e com os adeptos do Marinhense, que “podem esperar uma equipa muito comprometida para conseguir ficar nos dois primeiros lugares” da Série C do Campeonato de Portugal.

“Sabemos que não é fácil, mas o nosso foco é esse e vamos trabalhar todas as semanas para conseguir os três pontos e tentar chegar a esse objetivo”, vaticinou Miguel Vinagre, em declarações ao Jogo do Povo, no Bancada.

Entre fintas, gincanas ou guinadas, o importante é chegar com sucesso ao golo para se soltar a festa, como se de uma obra de arte se tratasse, como se uma porta em vidro fosse aberta para dar entrar no espaço da glória. Pelo golo é que se vai à bola, que o diga Miguel Vinagre, que ainda passou por outros desportos mas foi o futebol que lhe deu um reflexo perfeito ao espelho.

“Eu sou um amante de desporto, e houve uns anos em que pratiquei três modalidades ao mesmo tempo”, revelou ao Bancada, lembrando que chegou a jogar “futebol, hóquei patins e basquetebol”.

Três modalidades ao mesmo tempo

Hoje, o defesa do Marinhense reconhece que foram tempos de desafio para ele e para a família.

“Acho que aí foram anos duros para a minha família, os meus pais basicamente tinham de andar comigo de um lado para o outro com jogos e treinos”, recordou o jogador, deixando nas palavras um agradecimento aos pais.

“Nunca me falharam com nada desde de material para todas as modalidades (e não era propriamente barato) fora o tempo que despenderam para isto tudo”.

Mas quando se faz o que se gosta, o desgaste nem se faz sentir, sobretudo quando se é jovem. 

E mesmo com a idade a avançar inevitavelmente, Miguel Vinagre continua a sonhar com o futebol mais bonito que se lembra, a projetar os sonhos que sempre teve na bola e que são metas por alcançar.

“Ainda não consegui festejar um título enquanto sénior”, lamentou o central, lembrando que no ano em que a pandemia de covid paralisou o mundo, perdeu “essa oportunidade no Alcains”.

“Aí, acabou por ser um momento que guardo com tristeza, bem como perder uma final da taça em Castelo Branco”, observou ao Jogo do Povo o jogador que, nesta época está focado a “100 por cento” no Marinhense e no futebol.

Futebol a "100 por cento" 

“Esta época estou só dedicado a 100 por cento ao futebol, até porque no início da época estive na Trofa e não dava para conciliar outra profissão e queria estar 100 por cento focado na parte futebolística”, explicou Miguel Vinagre, ciente de que nem sempre consegue viver só do que o futebol gera.

“Na época anterior dava Atividades de Enriquecimento Curricular (AECs) e por vezes dava uns treinos físicos personalizados em casa”, contou o jogador que, entre sorrisos, assumiu que deve ser o atleta “mais chato” do balneário do Marinhense, um clube que mora no coração da capital do vidro e que foi fundado em 1 de Janeiro de 1923 e que começou a jogar no Pinhal da Feira.

É certo que perto do reduto marinhense atual há muito espaço para o futebol e não existem propriamente preocupações com os vidros que possam quebrar-se com uma ‘bolada’.

Mas o plantel sabe que existem outras preocupações, como Miguel Vinagre deu conta, sobretudo porque a equipa enfrenta uma competição forte.

“É um campeonato muito competitivo, acaba por ser uma boa montra apesar de ter perdido um bocado de visibilidade com a Liga 3 que, a meu ver, tem toda a lógica de existir”, enfatizou Miguel Vinagre, deixando uma ideia diretamente para a Cidade do Futebol.

“Como já existe a Liga 3, a Federação Portuguesa de Futebol devia criar uma stream com os jogos todos do campeonato, até é algo que já existe em outras modalidades”, desafiou o jogador do Marinhense através do Jogo do Povo.

“Quem não sopra, já soprou”

Porque o futebol evoluiu tal como a indústria vidreira, porque tudo muda, avança e se desenvolve. Mas há coisas que nunca mudam e nunca se esquecem.

Na Marinha Grande, por muito que a mecanização das funções na produção vidreira avance, jamais se esquece a importância do sopro porque, como é tão tradicional dizer-se, “quem não sopra, já soprou”.

No país todo, por muito que as condições para se jogar à bola sejam melhoradas, há quem ainda procure uma parede para fazer uns remates ou a rua para ‘dar uns toques’, mas sempre com medo de entrar em despesas. Por isso, como os país sempre dizem: Cuidado com os vidros.