Sven Goran Eriksson é um histórico do Benfica. Mas qual a razão deste treinador sueco ser tão popular em Portugal? Em Portugal e não só, pois Eriksson é um nome marcante do futebol europeu.
Com esta biografia de Eriksson vamos recordar a influência do técnico sueco, com natural destaque para a dupla passagem como treinador do Benfica.
Sven Goran Eriksson e Benfica
Em 1982, o presidente do Benfica, Fernando Martins apostou num jovem treinador que tinha acabado de fazer história na UEFA.
Pela primeira vez, o IFK Gotemburgo, crónico campeão da Suécia, ganhou a Taça UEFA. Mais surpreendente ainda, o treinador dessa equipa tinha iniciado a carreira apenas cinco anos antes.
Assim, Sven Goran Eriksson chega à Luz como vencedor da Taça UEFA 1981/82, campeão sueco e ainda vencedor de duas Taças da Suécia (1978/79 e 1981/81).
Todavia, é importante não esquecer: a carreira do treinador Eriksson começou em janeiro de 1977, no modesto Degerfors.
Primeira época de Eriksson no Benfica
A aposta acertou em cheio. Logo na primeira época, Eriksson leva o Benfica à final da Taça UEFA.
Nessa campanha, as águias eliminaram Real Bétis (Espanha), KSC Lokeren (Bélgica), FC Zurique (Suíça), Roma (Itália) e Universidade Craiova (Roménia).
Assim, chegaram à final (à época, jogada a duas mãos) com o Anderlecht, a poderosa formação belga que tinha eliminado o FC Porto na segunda fase da prova europeia.
Porém, Eriksson tinha um plantel recheado de talento. A começar pela baliza, segura pelo icónico Manuel Bento e protegida por defesas como Humberto Coelho, Pietra, Veloso e Álvaro Magalhães.
Na frente, Nené, Chalana e Filipovic eram alimentados por craques como Carlos Manuel, Diamantino, João Alves e Shéu.
Ainda assim, o principal segredo do Benfica desse tempo era o presidente. “Fernando Martins era visionário pela sua filosofia: salários normais, prémios de jogo altos. E era visionário porque viu em mim qualidades para liderar uma grande equipa europeia como o Benfica. Eu só tinha 34 anos e era sueco, de um país sem tradição no futebol mundial”, afirmou Eriksson, numa entrevista ao Observador em 2017.
Benfica na final da Taça UEFA
Apesar de todo o talento disponível, a missão do Benfica era tudo menos fácil. O Anderlecht dessa altura era temível, ostentando as recentes vitórias na Taça dos Vencedores das Taças (duas) e na Supertaça Europeia (também duas).
A primeira mão, no Estádio do Heysel, em Bruxelas, terminou com uma vitória belga por 1-0. Um resultado que deixava o Benfica de Eriksson confiante numa reviravolta na segunda mão.
E, na Luz, o início foi perfeito. Shéu empata a eliminatória aos 32 minutos. No entanto, a alegria durou pouco. Seis minutos volvidos, Lozano empata a partida. Graças à vitória na primeira mão, o Anderlecht vence a Taça UEFA 1982/83 nessa final com o Benfica.
Títulos de Eriksson no Benfica
Num total de cinco temporadas na Luz, Sven Goran Eriksson conquistou cinco troféus como treinador do Benfica:
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3 Campeonatos Nacionais (1982/83, 1983/84 e 1990/91);
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1 Taça de Portugal (1982/83);
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1 Supertaça de Portugal (1989/90).
A aventura italiana
Agora, a Premier League é apontada como o melhor campeonato do mundo. A liga inglesa retirou esse título ao campeonato espanhol, que viveu o seu período de ouro com a rivalidade de Cristiano Ronaldo e Real Madrid contra Lionel Messi e Barcelona.
Porém, na altura em que Eriksson chegou à Luz, o campeonato mais afamado era o italiano. O ‘Calcio’ era o sonho de qualquer jogador e até de qualquer treinador, ainda que nessa altura não fosse tão habitual uma equipa italiana ter um técnico estrangeiro.
Em duas temporadas na Luz, Eriksson foi bicampeão pelo Benfica. E despertou a atenção da Roma, que o contratou no verão de 1984. Na segunda temporada, Eriksson leva a Roma a ganhar a Taça de Itália.
Seguiu-se a Fiorentina, entre 1987 e 1989. Então, surge a oportunidade para Eriksson voltar ao Benfica.
Eriksson regressa ao Benfica
A temporada de 1989/90 prometia ser escaldante. Na ressaca do ‘Caso Ademir’, o Benfica foi campeão com Toni no banco. O mesmo Toni que, na passagem de Eriksson, tinha sido técnico adjunto do sueco.
Ora, o presidente do Benfica, João Santos, decidiu reeditar essa dupla de sucesso. E os vice-presidentes Jorge Brito e Gaspar Ramos, nomes históricos na Luz, concordaram.
Assim, Sven Goran Eriksson regressou ao Benfica. De novo, com Toni como adjunto. E, também de novo, Eriksson levou o clube encarnado a ganhar o campeonato (1990/91). E, também de novo, o Benfica de Eriksson chega a uma final europeia.
A maldição de Guttmann?
Na primeira época da segunda passagem pela Luz, Eriksson levou o Benfica à final da Taça dos Campeões Europeus. Era a segunda final europeia para o sueco, enquanto o clube vinha da recente derrota na final dos campeões europeus de 1987/88, diante do PSV.
Por outro lado, a missão encarnada na Taça dos Campeões Europeus de 1989/90 parecia impossível, à semelhança do que aconteceu em 1983. O adversário na final era o AC Milan de Sacchi, ‘apenas’ o campeão em título e vencedor do Mundial Interclubes de 1989 (ganharia também em 1990) e da Supertaça Europeia de 1989.
Um AC Milan do ‘Calcio’, sim, mas com o perfume das tulipas holandesas. Rijkaard, Gullit e Van Basten eram os expoentes de uma equipa com Baresi e Ancelotti, com Costacurta e Paolo Maldini.
E foi o holandês Frank Rijkaard quem marcou o único golo dessa final de Viena, em 23 de maio de 1990. Pela segunda vez, o Benfica de Eriksson perdia uma final europeia. Uma derrota que alimentou ainda mais a famosa “maldição de Guttmann”, o treinador húngaro que levou o Benfica ao bicampeonato europeu de 1960/61 e 1961/62.
Eriksson treinador do Benfica: Que imagem deixou?
Mesmo perdendo essas duas finais europeias, o Benfica de Erikssson impressionou a Europa do futebol.
Passadas três décadas, não faltam elogios de ex-jogadores e outras personalidades do Benfica sobre o treinador sueco.
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Toni: “Era um jovem, tinha 30 e poucos anos quando chegou. Veio romper com aquilo que era o treino na altura, todos os jogadores aderiram ao método de treino, à proposta de jogo que ele criou”;
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Diamantino Miranda: “Foi, nessa altura, o ressurgir do Benfica europeu, e o clube ganhou um grande prestígio na Europa nesses anos”;
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Shéu: “Muitos adeptos do Benfica não acompanharam ao vivo a transformação que Eriksson fez, muitos não eram sequer nascidos. Mas a história fez-se para ser contada”;
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Álvaro Magalhães: “O Eriksson revolucionou o futebol português. Revolucionou na metodologia de treino, na mentalidade, em todos os aspectos. Foi ele. O Eriksson revolucionou tudo o que é o futebol actual. O que muitos fazem agora, já nós fazíamos na altura”;
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Fernando Mendes: “Tinha a ideia dele, quer gostassem ou não. Quando os jogadores iam falar com ele, por jogarem pouco ou não jogarem, mostrava vídeos da atitude [do jogador em causa] nos treinos”;
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Sílvio Cervan: “Bem sei que o meu avô me descrevia o feiticeiro Béla Guttmann, bem sei que o meu pai me narra os feitos do disciplinador Jimmy Hagan, mas sejamos sinceros, na minha existência, Sven foi o maior, o meu herói. Sven Goran Eriksson tinha um futebol fantástico e fazia o futebol fantástico”.
O adeus de Sven Goran Eriksson ao Benfica
Mas tudo tem um fim e, no verão de 1992, Eriksson volta a dizer adeus ao Benfica. Tal como antes, vai para o ‘Calcio’.
Este regresso ao futebol italiano começa na Sampdoria, onde Eriksson conquista mais uma Taça de Itália, e prossegue na Lázio.
É neste clube que Sven Goran Eriksson treina mais um jogador português, Sérgio Conceição. O agora técnico portista era um dos craques de uma Lázio que tinha ainda jogadores da classe de Diego Simeone e Roberto Mancini, de Verón e Simone Inzaghi.
Pela Lázio, Eriksson conquista a Supertaça Europeia, o campeonato de Itália e a Supertaça de Itália (duas vezes), dois troféus que lhe faltavam no palmarés.
Além disso, ganha a Taça UEFA pela segunda vez e ainda acumula mais duas Taças de Itália.
Um sueco como selecionador de Inglaterra
Por essa altura, Sven Goran Eriksson era reconhecido pela sua aura de campeão. Então, surgiu um desafio que não podia recusar: ser o primeiro treinador estrangeiro no comando da seleção de Inglaterra.
Entre 2001 e 2006, o técnico sueco apresentou um desempenho de alto nível. No Mundial 2002, a Inglaterra foi eliminada nos quartos de final pelo Brasil, que venceria o torneio. No Euro 2004, os três leões voltam a cair nos quartos de final, mas só nos penáltis. E foi diante de Portugal, que seria finalista desse Europeu.
Por fim, no Mundial 2006, a Inglaterra de Eriksson é eliminada nos quartos de final. De novo, por Portugal. E, de novo, nos penáltis.
Todavia, Eriksson continua no futebol inglês. Deixa a seleção, mas assina pelo Manchester City, ajudando a criar as bases do clube que é atualmente dos mais dominantes do futebol europeu.
“Terceira vez no Benfica? Fiz uma má escolha”
Em 2008, Eriksson aceita novo trabalho como selecionador, agora à frente do México. Seria ainda selecionador da Costa do Marfim, depois de uma passagem (como diretor desportivo) pelo Notts County. O técnico sueco seria ainda treinador do Leicester antes de aceitar desafios muito menos mediáticos:
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BEC Tero Sasana (diretor desportivo);
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Al-Nasr (diretor desportivo);
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GZ R&F;
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Shanghai SIPG;
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Seleção das Filipinas;
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IK Karlstad (consultor);
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IF Karlstad (diretor desportivo).
Já com a carreira perto do fim, Eriksson assumiu que cometeu “um erro” quando aceitou ser selecionador do México. Em entrevista ao Reuters, o técnico revelou que, após deixar o City, teve um convite para regressar ao Benfica.
“Escolhi o México e foi um erro. Fiz uma má escolha. Se queremos estar na alta roda do futebol, temos de estar na Europa. Se formos para o México somos rapidamente esquecidos”, explicou.
Homenagem a Eriksson
Em janeiro de 2024, cerca de um ano após terminar funções no IF Karlstad, Sven Goran Eriksson assumiu o final da carreira de treinador. E a revelação foi chocante: “Tenho menos de um ano de vida”.
Em entrevista, Eriksson contou que sofre de um cancro no pâncreas, em estado terminal. A notícia de Eriksson com cancro chocou o futebol europeu. Porém, o contra-ataque foi imediato. Por toda a parte, o futebol respondeu prestando a devida homenagem a Eriksson.
Ou melhor, homenagens. Assim mesmo, no plural. Afinal, as conquistas e marcas do técnico sueco foram também elas plurais.
Numa dessas homenagens, Eriksson realizou “o sonho” de orientar o Liverpool, num jogo de lendas com o Ajax. “É uma boa maneira de acabar”, confessou: “Quando era treinador sempre quis ir para o Liverpool, mas nunca aconteceu”.
Como é natural, também a homenagem do Benfica a Eriksson foi especial para o sueco.
“É muito bonito! Estou a chorar. Muita sorte a Rui Costa e a todos os benfiquistas. Obrigado a todos os benfiquistas. Muito obrigado a todos”, agradeceu Sven Goran Eriksson, ovacionado pela última vez no Estádio da Luz.